Acesso à justiça: STJ ultrapassa os cem mil habeas-corpus

Instrumento processual criado para garantir o bem mais importante além da própria vida, o habeas-corpus, protetor da liberdade individual, superou a marca das cem mil autuações no Superior Tribunal de Justiça (STJ). O boom desse tipo de ação ocorreu a partir de 1999. Naquele ano, o Tribunal somava dez anos de existência e apenas 10 mil habeas-corpus. Em fevereiro passado, o STJ ultrapassou a quantidade de habeas-corpus que o Supremo Tribunal Federal (STF) colecionou em cem anos de historia. O ritmo acompanha a ânsia dos brasileiros pelo acesso à Justiça, mas é contido pela limitação humana dos magistrados. Cada ministro do STJ recebe, em média, por mês, mil novos processos para análise e julgamento. “O número de processos do Superior Tribunal é assustador. O recurso especial e o agravo já ultrapassaram um milhão (de processos autuados). Se continuar assim, o que será do Superior Tribunal?”, questiona o ministro Nilson Naves, decano do STJ. Do total de habeas-corpus que chegam ao Tribunal, 97% são julgados na Quinta e Sexta Turmas, órgãos competentes para apreciar as questões de direito penal, juntamente com a Terceira Seção. Os ministros desdobram-se para equilibrar a quantidade de habeas-corpus julgados, especialmente aqueles casos de réus presos, sem preterir os julgamentos dos demais tipos de processo, como os recursos. Nesses órgãos, cerca de 30% dos processos em tramitação são habeas-corpus. Opção processualO ministro Arnaldo Esteves Lima, presidente da Quinta Turma, considera que o ajuizamento de tantos habeas-corpus é fruto da busca, pelas partes, de uma solução para seus conflitos na área criminal por intermédio da Justiça. “É um indicativo de civilidade, de mais cidadania”. Por outro lado, ele adverte que o Tribunal não tem capacidade de atendimento de um número tão elevado de habeas-corpus num prazo mais breve, como é desejável e estabelecido constitucionalmente. Um novo inciso incluído pela Reforma do Judiciário (Emenda Constitucional 45/2004) no artigo 5º da Constituição Federal determina uma duração razoável do processo judicial e celeridade na tramitação. No STJ, os habeas-corpus que concluíram a tramitação em janeiro de 2008 levaram, em média, 439 dias da autuação ao arquivamento. Já os recursos especiais na mesma situação permaneceram no Tribunal, em média, 380 dias, desde a autuação à baixa ao Tribunal de origem. Além da descoberta do STJ pelos cidadãos, uma explicação possível para o grande número de habeas-corpus que chegou ao STJ nos últimos nove anos é a opção dos advogados por esse tipo de ação. O presidente da Quinta Turma afirma que, em muitos casos, o que se debate nos habeas-corpus poderia ser contestado por meio de recurso especial, mas a defesa faz a opção pelo meio processual mais célere, em tese, o habeas-corpus. Nesses, é possível a concessão de liminar, geralmente apreciada de imediato. O presidente da Sexta Turma sugere outra explicação possível. Para o ministro Nilson Naves, é nítido o aumento do número de habeas-corpus que passou a chegar ao Tribunal depois da mudança de entendimento quanto à possibilidade de progressão de regime para condenados por crimes hediondos. Ele observou o fenômeno desde o final do ano 2004, quando a Sexta Turma, por maioria, passou a adotar essa posição. Filtro de relevânciaComposto atualmente por 29 ministros em atividade e dois magistrados de segunda instância convocados, o STJ está em busca de soluções para frear a enorme demanda enfrentada nos últimos anos. Uma das idéias tem no ministro Nilson Naves seu principal defensor. O ministro prega que o STJ adote uma espécie de filtro de relevância, pelo qual passariam todas as demandas endereçadas à Corte. A prática tem uso na Suprema Corte norte-americana. O STJ teria uma jurisdição obrigatória, com temas sobre os quais o Tribunal teria obrigação de se manifestar, e uma jurisdição discricionária, que ficaria a cargo da análise dos ministros, dando prioridade para questões importantes pelo seu aspecto jurídico e pelo alcance que a decisão terá. A prioridade seria o julgamento de questões que não se restringissem apenas às partes do processo, mas que tivessem relevância para uma parcela significativa da população ou que servissem de parâmetro. A idéia é reduzir o número de processos, sem restringir o direito do cidadão ao recurso. “O normal é que toda a pessoa tenha duas oportunidades para discutir a sua causa, o que continuaria sendo garantido. Além do que, aquele que tem o bom direito quer uma solução breve para o seu caso. O perdedor é que quer rediscutir”, destaca o ministro Nilson Naves. A medida não se aplicaria aos habeas-corpus, mas a proposta sugere que o STJ se abstenha de apreciar os habeas-corpus de apenados que cumprem pena de detenção relativas a crimes menos graves.
Fonte: STJ

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