Empate beneficia acusado e restabelece desclassificação de crime de associação ao tráfico de drogas
DECISÃO
Terminou empatada a discussão sobre a possibilidade de o Ministério Público se manifestar em determinada fase processual pela desclassificação de um crime e, posteriormente, por atuação de um outro promotor, pedir a condenação por um crime mais grave. Com o empate, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou o entendimento mais benéfico ao réu e anulou o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ/RJ) que impôs sanção mais grave aos réus depois de a sentença desqualificar o crime de associação para o tráfico de drogas. No caso, dois réus foram denunciados por tráfico e um deles, também por porte ilegal de armas. A sentença desqualificou o delito de tráfico para uso de substância entorpecente e manteve a acusação de porte de armas, depois de solicitar a manifestação do Ministério Público (MP). Interposto o recurso de apelação, o Tribunal revisou essa decisão com base em parecer de um outro promotor e condenou ambos os acusados a três anos de reclusão em regime fechado por associação ao tráfico.
A defesa alegou ao STJ que, se a opinio delict – base com que o promotor se convence da justa causa para oferecer a ação penal – pudesse ser revista pelo promotor que sucedeu o anterior, os princípios do Ministério Público (MP) como unidade e sua indivisibilidade estariam completamente esvaziados, pois o órgão teria tantas opiniões delitivas quantos fossem seus integrantes. São princípios do MP a independência, a unidade e indivisibilidade: seus membros atuam como se fossem um. O Tribunal de Justiça entendeu que a divergência de opiniões entre seus representantes deve ser respeitada por previsão constitucional, que dá liberdade de convencimento a seus membros.
O relator no STJ, ministro Paulo Gallotti, entendeu que mesmo o representante do MP tendo entendido que, na fase de alegações finais – razões produzidas em juízo antes da decisão –, a hipótese não seria de levar a uma condenação por tráfico, não existe obstáculo para que um outro membro interprete os fatos de forma diferente, buscando, por meio de recurso, uma condenação. O ministro destaca que a independência funcional não é incompatível com a unidade da instituição. “O princípio da independência, longe de dar carta branca à atuação arbitrária de membro do MP – e para coibir eventuais desvios existem os órgãos de correição –, tem por escopo tornar efetiva a atuação ministerial, de modo a atingir a defesa da ordem jurídica”.
O ministro Nilson Naves, que abriu a divergência, também não tem dúvida quanto à independência funcional do MP, mas vê com reservas essa irrestrita liberdade. Ele assinala que uma coisa é a independência, outra coisa é o interesse em agir em determinados momentos processuais. Não há dúvidas de que o órgão possa pedir ao juiz que absolva o réu, mas “não é saudável, nem elegante” que volte seus próprios passos em nome ministerial e “desdizer o que já se havia dito em benefício do réu”. “Feita uma coisa, feita está; desfazê-la significa ou ter dois pesos ou duas medidas, ou lhe conferir sabor lotérico, porque um representante não pode recorrer, outro pode”.
O julgamento ficou em dois a dois. O empate restabelece a sentença do juiz da 6ª Vara Criminal de Nova Iguaçu.
Fonte: STJ
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