Encerrada ação penal contra acusado por falta de individualização de conduta
Por votação unânime, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal
(STF) determinou, nesta terça-feira (23), o trancamento de ação penal
em curso na 8ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Porto Alegre
(RS) contra J.L.M., acusado, juntamente com diversos outros corréus, dos
crimes de formação de cartel, tráfico de influência, corrupção ativa e
formação de quadrilha. Tais crimes estão descritos, respectivamente nos
artigos 4º, incisos I, “a” e II “a", da Lei 8.137/90 e 332, 333,
parágrafo único, e 288 do Código Penal (CP).
A decisão, tomada no julgamento do Habeas Corpus (HC) 113386,
relatado pelo ministro Gilmar Mendes, beneficia somente esse réu na ação
penal em curso na Justiça gaúcha. Como há uma audiência marcada para
amanhã (24) na 8ª Vara Criminal de Porto Alegre, a Turma, a pedido do
advogado de defesa, determinará a imediata comunicação àquele juízo
acerca da decisão tomada na sessão de hoje.
Denúncia
Contra J.L. pesava a acusação de ter participado de uma manobra de
grupos de extração de areia nas bacias dos rios Jacuí e Caí, no interior
gaúcho, para obter monopólio dessa atividade naquela região, além de
fixarem preços abaixo do mercado para eliminar a concorrência (cartel).
Além disso, era acusado de fornecer vantagens a membros da Patrulha
Ambiental gaúcha (transporte em barco particular até o local em que se
encontrava ancorado o barco de fiscalização da patrulha, bem como
fornecimento de lanche a soldados). Além disso, teria prometido a um
major da Polícia Militar (PM) gaúcha, que atuava na Patrulha Ambiental,
exercer influência junto a autoridades estaduais para que fosse
promovido a coronel (tráfico de influência). E, para perpetrar tais
supostos crimes, ele se teria unido com quadrilha com representantes de
outras empresas do setor.
Alegações
Em sua decisão, o colegiado do STF endossou os argumentos da defesa,
de inépcia da denúncia e falta de justa causa. Segundo alegou o advogado
do acusado, não consta na acusação a individualização dos supostos
crimes que J.L. teria cometido, além de figurar como proprietário de
empresa alvo das investigações, quando, segundo sua defesa, ele sequer
era sócio, mas apenas procurador dela.
No HC hoje julgado, a defesa se insurgia contra decisão do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) de negar HC lá impetrado com o mesmo
propósito. Aquela corte entendeu que, diante da pluralidade de agentes
(acusados no processo em curso em Porto Alegre), não seria possível
descrever milimetricamente a conduta de cada réu. Além disso, observou
que atender o pedido favoreceria a impunidade e seria um incentivo a
práticas criminosas.
O defensor de J.L. questionou, também, se é crime influir para que
alguém seja promovido, quando essa é uma prática comum na sociedade
brasileira, além do que a denúncia não descreve se, onde, quando e como
ele exerceu influência.
Questionou, também, se constitui crime ajudar a Brigada Militar (PM)
gaúcha, por meio de sua Patrulha Ambiental, a chegar ao seu barco e a
oferecer lanche, quando esta também é uma prática comum, diante das
dificuldades que tais profissionais enfrentam no exercício de suas
funções.
A defesa disse que, no curso do processo na capital gaúcha,
observa-se “um quadro dantesco”. Isso porque, segundo alegou, todas as
testemunhas negam envolvimento de J.L. nos crimes a ele imputados,
enquanto o Ministério Público se mantém silente durante tais audiências.
Votos
O relator do processo na Suprema Corte, ministro Gilmar Mendes,
ressaltou a excepcionalidade do trancamento de ação penal, seja por
falta de justa causa, seja por inépcia da denúncia. Entretanto, neste
caso, segundo ele, as imputações feitas a J.L. são genéricas e não
fornecem qualquer suporte fático para corroborar a denúncia. Além disso,
quanto às supostas vantagens oferecidas, ele concluiu que se trata de
conduta atípica. De acordo com ele, “a rigor, a conduta dele nem está
descrita”.
Os ministros Teori Zavascki, Cármen Lúcia, Celso de Mello e Ricardo
Lewandowski seguiram o voto do relator. O ministro Celso de Mello
observou que, nos crimes societários, não basta invocar a condução de
sócio, gerente ou administrador de uma empresa. É preciso individualizar
sua conduta típica para caracterizar fato criminoso. No mesmo sentido
se pronunciou o ministro Ricardo Lewandowski, presidente da Segunda
Turma. Segundo ele, sequer se descreveu, na denúncia, a função exata de
J.L. na empresa.
FK/AD
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Fonte: STF.
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